(ilustração: Matt Smith / SF Weekly)
Não é apenas em São Paulo que a especulação imobiliária caminha de mãos dadas com a máfia automobilística.Em São Francisco (EUA), uma campanha liderada pelo bilionário republicano Don Fisher (fundador da grife GAP) e pela Webcor (gigante da construção civil) tenta desmontar o plano urbanístico da região central, consolidado a partir de 1983 com ampla consulta pública e participação da sociedade.
A “Iniciativa para Estacionamentos nas Vizinhanças” (ou Fisher’s Initiative) pretende aproveitar a readequação de uma antiga área industrial próxima ao centro da cidade para acabar com uma antiga norma do plano urbanístico: o limite de uma vaga de garagem para cada quatro apartamentos construídos na região.
Isso mesmo: no centro de São Francisco, prédios novos só podem ter uma vaga para cada quatro apartamentos!
Os argumentos da campanha se baseiam na falácia mercadológica de que o desejo dos consumidores é morar em locais com vagas de garagem. Os automobilistas também chantageiam a prefeitura, dizendo que, se a norma não for revogada, São Francisco irá perder empregos e negócios para as regiões vizinhas.
Não é o que mostra a história da cidade, onde até o luxuoso hotel Grand Hyatt foi construído sem nenhuma vaga para automóveis.
Empreendimentos imobiliários com muitas vagas para carros só tendem a agravar o estado de imobilidade das cidades. Uso do solo e políticas de mobilidade são conceitos itimamente relacionados.
Estima-se que cada carro em circulação consuma diariamente sete vagas de garagem em locais distintos. A equação é simples: mais vagas, mais carros, menos espaço para pedestres, ônibus, praças, parques, bicicletas e espaços de convivência humana.
Centro de SP – ao fundo, Bom Retiro e Luz, dois alvos da especulação
(foto: gira)
Em São Paulo, cidade onde os apartamentos de classe média possuem mais vagas do que moradores, a especulação imobiliária avança com força total para “revitalizar” o centro. Nos antigos bairros da Luz, Bom Retiro, Campos Elíseos e arredores, começam a pipocar os primeiros empreendimentos imobiliários voltados à classe média, todos com muito espaço para os carros.As ruas tranqüilas da região central de São Paulo, ainda que abandonadas há décadas pelas iniciativas pública e privada, ainda são um oásis para pedestres e ciclistas: calçadas largas, farta rede de transporte coletivo e ruas sem trânsito.
Se a “revitalização” em curso continuar baseada no fechamento de calçadões e servir apenas para atender aos anseios dos especuladores, é apenas questão de tempo para que os congestionamentos, a poluição e o barulho dos motores acabem com qualquer esperança de trazer vida à região.
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